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Crítica teatro - Quem sou eu? Buscar a identidade é preciso

Buscar nossa identidade requer coragem. E foi isso que Antonio Pitanga, em sua maturidade jovem, pensante, atuante, nos mostra na peça Embarque Imediato, que termina sua temporada hoje, no Sesc Consolação, escrita por Aldri Anunciação e dirigida por Marcio Meirelles.

Em uma cabine de aeroporto, o personagem de Antonio Pitanga, um homem africano aos 80 anos de idade, vestindo uma bata africana sem bolsos, encontra o personagem de Rocco Pitanga, um rapaz de 33 anos pesquisador do dramaturgo Bertold Bretch numa cabine de aeroporto no Brasil, ambos presos devido à perda de seus passaportes.


O homem idoso vai mostrando sua sapiência durante a peça e faz uma reflexão com o rapaz que o vira do avesso. Se no início o idoso apresenta-se velho e vulnerável, enquanto o jovem se mostra mais esperto e forte, o contrário vai se revelando. “Fique tranquilo, meu amigo, que esta doença chamada juventude passa”, ironiza a frase do rapaz que o chama vulnerável.


Você quer dizer que um jovem é menos vulnerável do que um idoso? Fica a pergunta no ar.

A vigilância e a frieza do tratamento com os dois homens presos na “sala clean” também é outro tema que aparece e que nos mostra tão atual, como bem lembra a Vigilância Líquida de Zigmund Baumman.


A personagem de Camila Pitanga aparece robotizada no momento de projeção audiovisual, sem qualquer expressão, tentando comunicar ou não comunicar nada sobre os próximos passos em relação à perda de documentos, uma sátira em relação ao descaso dos atendimentos call center, desumanos, que nunca resolvem nada e deixa as pessoas esperando, sempre no gerúndio.


As imagens da busca por DNA, neste mesmo telão, nos leva para a busca de nossa ancestralidade, que logo nos indica a pergunta. - Quem sou eu? Esta pergunta, para povos brasileiros, me parecem tocar em muitas feridas, sugerindo uma tentativa de tentar saná-las.


Este é o momento da busca pela ancestralidade, que pode ser curador. O próprio Pitanga, no final da peça, fala que precisou passar dois anos na África para encontrar suas origens, entender a sua existência. E sugeriu para os “caras pretas” também fazerem o mesmo caminho.


“Ninguém vai apagar as feridas da diáspora”, disse o Sr Pitanga. A dispersão dos povos, além de todos os males das escravidão, mutilou estes saberes, estas existências, e é isso que o encontro dos dois jovens negros nos faz refletir. - "Você vai pesquisar Bertold Bretch, do ocidente?" Os negros do Brasil precisaram se ocidentalizar. 


Repensar padrões e valores foi o que ficou para mim da peça Embarque Imediato, que assisti no último final de semana e tive a alegria de presenciar ao vivo o Sr. Antonio Pitanga, aos 80 anos, dando um show de vitalidade. Realmente, nossa juventude ocidental ignora a sabedoria de um idoso. - Cuidado! Nós estamos vivendo a vida por um aplicativo de celular, mais uma frase sábia do Sr Pitanga.


Foto: Leto Carvalho

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